Abordagem conhecida como 'liderar por trás' foi criticada, mas mostra resultados positivos aos EUA, um país cansado da guerra
Para o presidente Barack Obama, a imagem de um ensanguentado Muamar Kadafi
oferece justificativa, ainda que de maneira angustiante, à sua
intervenção na Líbia, onde um relutante comandante-chefe coloca limites
rígidos ao envolvimento militar dos Estados Unidos e permite que os
aliados da Otan assumam a liderança no apoio aos rebeldes.
Presidente americano Barack Obama faz discurso no jardim da Casa Branca, em Washington, sobre morte de Muamar KadafiA resposta cuidadosamente calibrada de Obama enfureceu os críticos à
direita e à esquerda, que o culparam tanto de ceder a liderança dos EUA
em um conflito estrangeiro ou por caminhar cegamente em outra terra
árabe sem uma estratégia de saída.
Mas com Kadafi entrando para a cada vez mais extensa lista de tiranos e terroristas mortos
durante a presidência de Obama, até mesmo os críticos admitiram sucesso
na abordagem do presidente em relação à essa guerra – que se baseia em
uma ação coletiva, em vez de unilateral, além de ataques cirúrgicos, no
lugar de implementações maciças de tropas ocidentais.
"Eu acho que o governo merece grande crédito", afirmou o senador John
McCain, republicano de Arizona, em uma entrevista à emissora CNN.
"Obviamente, eu tinha ideias diferentes sobre a questão tática, mas o
mundo agora é um lugar melhor."
McCain tinha pedido que os EUA impusesse uma zona de exclusão aérea
sobre a Líbia nos primeiros dias da rebelião e usasse um poder aéreo
mais pesado contra as forças de Kadafi uma vez que a operação da Otan
teve início – medidas que McCain dizia acreditar que teriam derrubado o
ditador muito mais cedo.
O presidente rejeitou esses pedidos, optando por uma estratégia mais
cautelosa que dependia do apoio de aliados da Otan e dos vizinhos árabes
da Líbia e que transferia grande parte do fardo da campanha aérea para
Grã-Bretanha e França. Foi uma estratégia adequada para um país cansado
de guerra e que precisa de dinheiro.
"Sem colocar um único membro do serviço militar americano no terreno,
alcançamos nossos objetivos e nossa missão da Otan em breve chegará ao
fim", disse Obama em um discurso proferido no Rose Garden, que serviu como uma silenciosa comemoração de vitória. "Nós demonstramos o que a ação coletiva pode alcançar no século 21."
Obama fez uma comparação entre a queda de Kadafi e os assassinatos de
Osama bin Laden e outros líderes da Al-Qaeda, dizendo que as mortes
mostram a "força da liderança americana em todo o mundo". Mas esse é um
tipo de liderança muito diferente daquele exercido pelo presidente
George W. Bush ou seus antecessores.
A estratégia foi resumida incisivamente por um conselheiro de
Obama não identificado, que a descreveu em um artigo na revista The New
Yorker como "liderar por trás", uma expressão usada posteriormente por
críticos como McCain.
"Está na hora de deixar de lado as interpretações sarcásticas como a
expressão ‘liderar por trás’ e simplesmente chamar liderança de
liderança", disse David Rothkopf, especialista em política externa que
escreveu um livro com a história do Conselho de Segurança Nacional.
"Esse foi o tipo de esforço multilateral, com melhor custo-benefício e
eficiência que qualquer iniciativa de política externa aspira."
Mesmo assim, Obama não deve obter qualquer crédito político duradouro
pelo sucesso da rebelião líbia – assim como ele recebeu apenas uma onda
breve de aprovação maior nas pesquisas após a incursão que matou Bin Laden no Paquistão.
Os candidatos presidenciais republicanos certamente não se apressaram a dar crédito a Obama. Eric Fehrnstrom, um assessor de Mitt Romney,
disse em comunicado que a morte de Kadafi "põe fim a um capítulo brutal
na história da Líbia, mas que não valida a abordagem do presidente no
país. O crédito vai para o povo da Líbia."
Mais tarde, após uma visita de campanha em Council Bluffs, Iowa,
Romney foi questionado se o presidente merecia algum crédito. "Sim, sim,
absolutamente", disse, antes de desaparecer por uma porta dos fundos.
Obama, segundo seus assessores, há muito tempo tenta equilibrar a
vontade de intervir em casos de atrocidades em massa com uma certa
relutância em ser atraído para combates em larga escala. Na semana
passada, por exemplo, ele ordenou que 100 conselheiros militares armados fossem enviados para Uganda,
onde vão ajudar a combater forças regionais do Exército de Resistência
do Senhor, um grupo renegado que tem estuprado e assassinado aldeões na
África central.
Na quarta-feira, o presidente reiterou que decidiu intervir na Líbia
depois que as "forças (de Kadafi) começaram a ir de cidade em cidade
brutalizando homens, mulheres e crianças". Mas ele também fez questão de
ressaltar que os EUA estavam terminando uma guerra no Iraque e
entregando a segurança do Afeganistão para os afegãos.
Outro elemento central da estratégia de combate de Obama não foi
mencionado: uma série de bases secretas para a decolagem dos drones,
aviões não tripulados usados pelos EUA na caça a suspeitos de
terrorismo, como Anwar al-Awlaki, o americano agente e propagandista da Al-Qaeda, que foi morto no mês passado no Iêmen.
"Ninguém poderia ter previsto que, em um período de seis meses,
veríamos a morte de Muamar Kadafi, Osama bin Laden, e Anwar al-Awlaki",
disse Benjamin Rhodes, um assessor de segurança nacional. "Mas elas
fluíram diretamente das decisões que o presidente tem feito desde o
início de seu governo."
Manter apenas operações limitadas como a da Líbia também faz sentido
num momento em que a Casa Branca está procurando cortar pelo menos US$
400 bilhões do orçamento do Pentágono.
"A coisa toda custou US$ 1 bilhão", disse Micah Zenko, um membro no
Conselho de Relações Exteriores. "E esse é um erro de arredondamento."
O problema para Obama, dizem analistas, é que a Líbia não chega a ser um modelo para outros conflitos.
No Bahrein, por exemplo, considerações estratégicas e a resistência da Arábia Saudita restringem as opções dos EUA. Na Síria, a Rússia e a China têm bloqueado os esforços
para aumentar a pressão sobre o presidente Bashar Al-Assad, em parte
pela experiência na Líbia, vista por eles como uma missão que excedeu a
sua autoridade.
"Na Síria, que é um importante eixo do Oriente Médio, o que aconteceu
na Líbia não pode ser replicado", disse Martin S. Indyk, diretor da
política externa do Instituto Brookings. "Não há consenso internacional,
pelo contrário, há uma divisão internacional."
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